Dentro de nossa caminhada pela Ciência das Linguagens percebemos que a visão humana ou relação da Semiótica com as outras Ciências se revela igual a irônica apresentação feita por Lúcia Santaella quando brincou: “Semi-ótica – ótica pela metade?” (SANTAELLA, 2012, p. 9)1, pois, é exatamente dessa forma que as Ciências da Humanidade encaram a Semiótica.
O problema começa a ser sentido a partir da própria apresentação da Semiótica às academias do conhecimento humano que reagem como se deparassem com um imigrante, estrangeiro que quer compartilhar o seu universo, mas enfrenta o preconceito delas como “que cara esquisito”, e, assim, é vista como algo exótico, ou, diferente, e as vezes até incompatível como o ambiente do conhecimento humano.
Conflito 1 – Além das fronteiras da Ciência
O início do conflito parte do que se entende por academias de conhecimento humano como referência às ciências da humanidades isto é, as ciências físicas e as ciências humanas, ou metafísicas, cujo o princípio de reconhecimento se dá a partir de um pressuposto lógico pela a captura do conhecimento a partir de um raciocínio lógico.
Esse processo teve inspiração pelo cartesianismo de Descartes e consolidou-se na física clássica de Newton, de que tudo deve ser explicado positivamente, a partir dos conhecimentos capturados, ou, apreendidos, o que pedimos licença para ilustrar com o exemplo daqueles vídeos que mostram o gato que se encanta pela luz do laser é quer agarrá-la a todo o custo, pois, na ilusão de adivinhadores e dominadores do futuro, o conhecimento sendo como água, não pode ser capturado pelo domínio lógico das mãos humanas, cujo melhor exemplo desse fracasso foi a própria física clássica do absolutismo lógico de Newton sendo reescrita pela física quântica de Planck e Einstein, tornando parte dessa mesma ciência as incertezas.
Conflito2 – Confundido como pensador
Como a ciência humana limita-se ao estudo voltado apenas para o humano, isto é, aquilo que só foi capturado logicamente como conhecimento, não consegue definir algo que é panterrestre, isto é, uma ciência capaz de unificar o conhecimento dentro do universo como lógica e fora dele como experiência, como podemos observar na apresentação de Peirce pelo Livro “Os Pensadores”:
A maior parte dos historiadores de filosofia considera Charles “Santiago” Sanders Peirce como o maior e mais original pensador que já surgiu na América do Norte (D’OLIVEIRA, 1989, p. VII)2.
O grande equívoco nesta apresentação e considerar Peirce como um pensador, Ele pode ter sido original, pode ter sido grandioso, mas não pensador, porque estaria contradizendo o pragmaticismo da própria ciência que ele apresentou, pois, o processo cognitivo apresentado aos homens por Peirce, não veio do seu intelecto, mas sim, de uma interpretação, ou, tradução, de uma ciência que vai além da compreensão humana, Peirce, testemunhando a paisagem do conhecimento real, expressou-a como Arte, não de autoria própria, pois a Semiótica é fenômeno de realidade e não pensamento que engaiola o conhecimento, talvez por essa caraterística de ciência panterrestre, a mesma Obra “Os Pensadores”, relata o exílio de Peirce como “entre tormentos”.
Apesar de todas as qualidades intelectuais de Peirce, sua carreira universitária não foi bem-sucedida. Personalidade instável e complexa, o filósofo teve uma vida pessoal muito atribulada, que o prejudicou nas atividades docentes.
(…) Em 1887, depois de herdar algum dinheiro, Peirce retirou-se para Milford, Pensilvânia, onde viveu em relativo isolamento até a morte, em 19 de abril de 1914. Os habitantes de Milfor não tinham dele a melhor das impressões: era considerado um excêntrico, pouco cuidados com a aparência, solitário e desregrado nos hábitos (Ibid.).
Conflito 3 – Realidade de fenômenos confundida como filosofia
O terceiro conflito é o tratamento dado à Semiótica como Filosofia de Peirce, o que consiste um grande equívoco, porque se Peirce apenas promoveu a interpretação das interações comunicativas com o ambiente, que é chamado de fenomenologia, não se trata de um pensamento de Peirce, ou Filosofia de Peirce, ou forma de pensar, mas sim, de um registro de realidade de um fenômeno, sem a contaminação da influência humana, cuja a participação de cada um se dá pela experiência da lei chamada de secundidade a aplicar a Ética que estrutura esse fenômeno.
Conclusão
As ciências da humanidade se prende na ambição de capturar o conhecimento a fim de que o homem possa se tornar dominador, ou adivinhador dos eventos, capazes de preverem o futuro, limitando-se assim a uma relação puramente humana, ao passo que a Semiótica traduzida por Peirce ao Mundo, a exemplo da Teoria do Caos, revela uma comunicação intensa de sentidos, não só entre os conhecimentos humanos, mas, interagindo-se com tudo o que estrutura o ambiente, isto é, uma comunicação que não se limita a ligação entre os pontos do Universo mas também à Vida que está além dele.
Por fim tem de se encarar a dura realidade, de que, ao se descobrir as incontáveis belezas de uma Ciência Viva, cuja tecnologia de inovação e criação acontece, na linguagem da ciência digital, em tempo real, traz como efeito os tormentos de Peirce, se vendo sempre como um forasteiro extra-terrestre, vivendo seu exílio.
Continua na próxima semana.
1SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1989.
2D’OLIVEIRA, Armando Mora. Peirce – Vida e Obra. In Os Pensadores – Peirce – Frege. 4ª Ed. São Paulo: Nova Cultural, 1989.
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